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domingo, 5 de julho de 2009

Feliz recomeço

Imagem: WEB
Na quinta hora da manhã, numa próspera cidade do nordeste brasileiro, Marcos – um homem relativamente jovem e atraente – cumprindo a rotina para uma vida saudável, despede-se do porteiro do seu edifício e, a passos largos e firmes, inicia a sua atividade física diária: sua caminhada matinal.


Depois da partida de sua esposa, resolvera aposentar-se. Encerrara a carreira de funcionário público na tentativa de recomeçar sua vida. Como seus três filhos – todos maiores, independentes e excelentes profissionais – residiam no exterior e raramente o visitavam, vivia solitário em uma casa espaçosa e confortável, repleta de lembranças do seu passado. Após o período de luto, optara por alugá-la e comprara um apartamento aconchegante próximo a uma reserva florestal.

A vista de sua janela era deslumbrante. Árvores gigantescas, de diferentes matizes de verde, eram a moldura daquele espaço natural que passara a habitar. Havia também um pomar com uma variedade capaz de atender a todos os gostos.

À noite, podia sentir os aromas de frutas, flores e mato. Eles o inebriavam. No entanto, ele preferia o dia, a luz do astro-rei e o colorido da natureza. Toda a beleza e a tranquilidade daquele ambiente, no qual era acordado pelo canto dos passarinhos, não o faziam feliz. Muitas vezes, mergulhava em recordações tristes e, em seu íntimo, alimentava o desejo de ter uma nova companheira que o amasse e entendesse para que pudesse voltar a sorrir – coisa que, praticamente, desaprendera, pois não sentia vontade de fazê-lo desde que se vira completamente só.

Após três voltas de aquecimento, na pista que circundava o condomínio, ele iniciara o seu Cooper. Como era feriado, havia poucos caminhantes, todos idosos e vizinhos seus. Nenhum deles conseguira acompanhar o seu ritmo e ficaram para trás. A certa altura, observou que se distanciara consideravelmente dos demais. Estava desacompanhado naquele lugar, como também estava em sua vida. De repente, ouviu gemidos. Caminhou, guiando-se pelo seu som, e teve uma surpresa e tanto: sentada, com uma expressão de dor nos lindos olhos verdes, de uma tonalidade incomum, estava a mais bela mulher que já vira em toda a sua vida. Loira, cútis clara, com aparência de porcelana, rosto de traços suaves no qual se destacavam além dos olhos expressivos, lábios carnudos e rosados que o fizeram paralisar. Por alguns instantes, chegara a pensar que se tratava de um sonho, contudo, mais um gemido o fez voltar à realidade. À sua frente estava uma mulher de carne e osso – uma rainha, na sua visão – que precisava de ajuda. Ela torcera o pé ao pisar em uma parte irregular do terreno. Solidário e prestativo, ele a cumprimentou e providenciou para que se apoiasse em um de seus ombros e pediu que ela lhe indicasse o caminho de sua casa. O contato com aquele corpo cheio de curvas e contracurvas o desconcertou sobremaneira. Ficou radiante ao descobrir que eram vizinhos. Ela morava sozinha. Seus pais viviam em uma pacata cidade interiorana e alugaram um daqueles apartamentos para ela poder dar continuidade aos seus estudos de nível superior. Ela cursava o segundo ano da faculdade de Gastronomia. Adorava cozinhar. Tinha vocação. Quanto aos assuntos do coração, há um ano não namorava, apesar de ser bastante admirada e assediada. Até simpatizara com alguns pretendentes, mas sua prioridade eram os estudos. Queria garantir seu futuro e sua independência.

Chegando à área do edifício, ele a acomodou em uma cadeira, na portaria do prédio, e dirigiu-se ao seu apartamento para pegar a chave do carro. Em poucos minutos já estavam na estrada em busca de atendimento médico. Para o espanto de ambos, foram logo atendidos. Feitos os exames, constataram que nada de grave acontecera. O pé da jovem foi imobilizado e eles liberados. A injeção de analgésico aliviara a dor e ela estava mais calma. Ele, para controlar as emoções que aquela mulher lhe causava, procurava concentrar-se na sua tarefa de dirigir. Kátia – o nome de batismo desta jovem – só agora passara a observar o seu anjo salvador. Tinha os cabelos e os olhos castanhos. A simetria do rosto era perfeita. Estatura mediana – parecia feito sob medida para ela. Seu corpo era esbelto e ágil – isso ela percebera quando ele a amparara. Não fosse tão longo o percurso, facilmente, a teria levado nos braços. Sentiu um descompasso em seu coração ao imaginar a cena. Contemplou com admiração o seu perfil. Ele tinha uma expressão grave e ela gostou do que viu. Marcos inspirava segurança, respeito. Kátia não precisava conhecê-lo muito para constatar que era diferente dos jovens inconsequentes que se interessavam por ela e dos quais fugia; afinal, se valorizava e não estragaria seus planos por causa de aventuras com criaturas volúveis.

Marcos sugeriu que alugassem uma muleta para que ela não perdesse a autonomia. A jovem concordou.

Finalmente, voltaram para seus lares. Ele a instalou e disse que não se preocupasse com as refeições, pois ele também sabia cozinhar e as providenciaria a fim de que Kátia pudesse ter o repouso recomendado pelo médico. Marcos notou o seu constrangimento e a tranquilizou dizendo: “Tenho certeza de que você faria o mesmo por mim, se eu estivesse em seu lugar.” A moça sorriu, pela primeira vez, e ele não disfarçou o encanto que o belo sorriso lhe causou. Seus olhares se encontraram e Kátia chegou à conclusão de que não seria fácil resistir àquele homem. Marcos, por sua vez, não queria sair dali. Aquela jovem era a concretização de sua mulher ideal. No entanto, precisava ir. Necessitava de um banho. Lembrou-se de que a despensa estava quase vazia. Iria às compras. Caso contrário, seria impossível preparar o almoço e o jantar de ambos. A contragosto, retirou-se.

Retornou por volta do meio-dia. Almoçaram juntos. Ela ficou impressionada com os dotes culinários de seu protetor. Conversaram amenidades, revelaram preferências e descobriram afinidades. Tornaram-se íntimos. Mais uma vez, Marcos sentiu dificuldade para afastar-se de sua protegida e ela lamentou as horas de sua ausência.

À noite, tudo se repetiu. Estavam ainda mais unidos, atraídos e encantados um pelo outro. Pareciam velhos conhecidos. Ao despedirem-se, Kátia deixou cair a muleta e desequilibrou-se. Para impedir a sua queda, Marcos a agarrou com força. Seus rostos ficaram próximos – muito próximos – e o primeiro beijo foi inevitável. Não tinham como voltar atrás. A atração foi incontrolável. Declararam seu amor recíproco.

Nos dias que se seguiram, eles descobriram que não poderiam viver um sem o outro. Então, resolveram casar-se e ir morar no apartamento dele.
Dois anos se passaram. Neste intervalo, Kátia concluiu o seu curso e resolveu, com o apoio do esposo, montar uma empresa de consultoria na área de gastronomia.
Atualmente, trabalham juntos e felizes. Sempre que podem, tiram uma folga e viajam pelo mundo afora. Marcos, enfim, recomeçou a sua vida, ao encontrar a mulher dos seus sonhos – o seu sol –, e voltou a sorrir.



Copyright © 2009 – 2012 © Josselene Marques

8 comentários:

Cantodomeucordel disse...

Além de ser uma estória muito bonita e narrada de forma criativa, lembra um lindo casal por quem tenho grande e especial apreço, rsrsrs.
Ah, criei um blog só de cordel e convido você para conhecer.

Poético abraço.

Anônimo disse...

Gostei, Josselene. A clareza do texto adicionado a perfeição da escrita fazem do conto uma ótima leitura. É claro que o final não poderia ser outro, mas, por isso mesmo o leitor fique preso ao enredo, pois espera que algo de ruim aconteça para que a felicidade não se complete. Você, arteiramente, não se deixa iludir e, tradicionalmente, encerra com "felizes para sempre". Muito bom.
Abraço,s
Raí

Sulla Mino disse...

Simplesmente divino! Você faz uso de tão belas palavras, algo "mui" repleto para ser lido, e admirado. Parabéns pelo Conto que acalentou meu domingo. Bjks,

Unknown disse...

Que lindo! Adorei o final feliz!

Muitos beijos para você florzinha.

Mágda Maria disse...

Maravilhoso!... Estou esperando pelo livro. Parabéns, mais uma vez! Estou cada vez mais orgulhosa!...

baladas mp3 disse...

Jossi:
Excelente capacidad de atrapar con una historia sencilla, contrariamente a muchos escritores que no transmiten nada.Te felicito, espero que cuando edites libros y seas famosa sigas siendo mi amiga..jeje.
Besos.

pêah nogueira disse...

Querida Josselene, quando Deus deu-lhe esse maravilhoso dom de tão bem tramar as palavras, foi com o intuito de levar aos corações das pessoas o alento e o conforto tão necessário nos dias de hoje.Parabéns,você foi muito feliz na elaboração do texto e, principalmente na sua conclusão.Adorei.
Abraços, Nogueirinha do 30.

Josselene Marques disse...

Gilbamar:

Muito obrigada pelos elogios. Quanto ao casal que me inspirou, eu, você e sua Ana conhecemos e temos, por ele, grande e especial apreço.
Visitei o seu blog, só de cordel, e gostei muito. Quanta criatividade!
Parabéns!
Abraços para você e sua esposa.

Professor:

Muito obrigada pelo acesso, incentivo e, especialmente, por valorizar o que escrevo. Os elogios vindos de um mestre das letras me deixam ainda mais motivada para escrever.
Volte sempre!
Cordial abraço.


Sulla:

Quanta gentileza!
Obrigada e volte sempre!

Abraço, amiga.


Ana:

Fico feliz que tenha gostado.
Pretendo escrever outros, assim que puder e/ou me inspirar.
Abraços e recomendações a Gilbamar.

Mágda:

Sempre gentil. Obrigada pelo incentivo. Tenho certeza de uma coisa: se o livro for editado, pelo menos um terá venda garantida. Assim espero... rsrs

Abraço e seja sempre bem-vinda!

Beto:

Es muy amable y atento. Gracias por tu elogio e por valorar mi historia.
Cuando editar mis libros (es un sueño), yo seguirè siendo tu amiga. No dudes!

Abrazo!


Nogueirinha:

Quanta gentileza!
Obrigada por destinar um pouco do seu precioso tempo para apreciar os meus escritos.
Volte sempre que puder e desejar.

Abraços fraternos para você e Rosa.