Atendendo a um pedido da amiga Berna, publico este texto, escrito por Juliana, em homenagem à sua Tia Alzira. Tive o privilégio de conhecer esta pessoa ímpar em minha adolescência e de revê-la, algumas poucas vezes, na idade adulta. É com prazer que lhe prestamos esta homenagem póstuma.
Alzira - um ser humano raro que nasceu para servir.
"Tia Alzira
Falar um pouco sobre ela é uma tarefa difícil porque ainda não conseguimos nos acostumar com a ideia de sua partida, afinal para aqueles que amamos, o tempo nunca é suficiente, nos faz pensar que o fio que a vida tece sempre nos dará uma nova oportunidade.
Mas não quero falar num tom solene, nem com palavras de pesar, porque falar de Tia Alzira é falar de alegria de viver, é falar da vontade de ainda realizar muitas coisas, é falar da persistência e de uma luta de uma vida inteira...
Menina nascida num interior simples, família humilde, aprendeu a ler sozinha com a ajuda da antiga cartilha de ABC, frequentou a escola, pela primeira, vez aos onze anos. Aprendeu seu ofício de costureira fazendo vestidos para suas antigas bonecas, depois suas criações foram ganhando o gosto da família, da vizinhança e logo se tornaram referência como as costuras mais bem feitas da cidade.
Enquanto moça, tinha a fama de ser a mais bela do lugar. Nunca teve vaidade, nem batom nos lábios, mas sempre teve a vontade de ser independente. Pensava um pouco diferente das moças de sua época...
Na sua juventude, tomou para si a responsabilidade de criar sua sobrinha Bernadete. Na verdade, ali, ela assumia seu papel de mãe. Criou-a com amor e carinho imensos. Mais tarde, juntou-se a elas seu outro sobrinho: Aluísio. A experiência de ser mãe foi levada com tanto afinco que pensando no futuro deles, para que tivessem a oportunidade que ela, até então, não tivera, encorajou-se, mesmo debaixo de críticas e preconceitos dos mais antigos, e mudou-se para uma cidade maior, reconstruindo sua vida lá através de muito esforço e tirando seu sustento da sua arte de costurar. Conseguiu concluir o segundo grau. E através da batalha diária foi vendo seus filhos-sobrinhos ficarem jovens. Na adolescência, sua outra sobrinha Georgete veio para a sua companhia, estreitando outro grande laço de afeto.
Essa nova cidade trouxera dificuldades, perdas, alegrias, amigos, conquistas. Trouxe a certeza de que ela tinha tomado a decisão correta, quando partiu para enfrentar uma nova perspectiva de vida, pois seus filhos-sobrinhos já começavam a caminhar na vida com suas próprias pernas. Aluísio foi tentar a vida no Rio de Janeiro e, mais tarde, devido ao seu trabalho, Bernadete mudou-se para Natal... Tempos depois, Dona Alzira, assim chamada por muitos, veio recomeçar a vida nessa nova terra.
Acredito que Deus dá, a cada um de nós, um dom único. À Tia Alzira, Ele presenteou com um talento brilhante para a costura. As peças feitas por ela sempre foram marcadas pela perfeição. Tudo que ela fazia era com uma dedicação e um amor notáveis.
Desde jovem, teve o sonho de possuir um espaço para tudo o que pudesse criar. Graças à bondade de Deus, agora na velhice, teve o prazer de ver seu sonho concretizado. E nós a oportunidade de encher os olhos com a beleza de suas criações. Tia era, de fato, uma artista.
Tenho muito que agradecer por ter compartilhado desse sonho com ela. Através dele cresci muito como pessoa. E sei que foi a herança mais bela que ela podia ter me deixado. Quando olho cada vestido, consigo ver neles tudo que ela representa para nós...
No entardecer da sua vida, descobriu a paixão por seus gatinhos. Sempre cuidou deles como se fossem crianças.
Em ocasião de seu sepultamento, as palavras de minha prima Edma me fizeram refletir: “Tia foi, de fato, uma pessoa que veio ao mundo para servir.”
Nunca se colocou em primeiro plano. Suas ações sempre se voltaram para o bem-estar de todos, sua jornada sempre foi para que seus filhos-sobrinhos tivessem as oportunidades que ela não teve.
Tia passou por muitas batalhas, por problemas de saúde, mas sempre com uma dignidade inabalável e uma vontade imensa de viver.
Foi uma pessoa que fez muita diferença em nossa vida, e eu sei que cada um tem por ela grande admiração e respeito e, acima de tudo, cada um sabe, em seu íntimo, o que a sua presença significava. Jamais quero lembrar-me dela com tristeza - não combina com a sua imagem, pois tia sempre foi uma celebrante da vida e assim permanecerá em nossos corações.
A senhora foi muito amada.
Esteja sempre em paz no Paraíso ofertado por Deus.
25 de novembro - lembramos com carinho desta data. Não temos mais sua presença terrena, mas temos a certeza de que, junto a Deus, olha por todos nós.
Juliana."